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narrativa

Maristela Benites
1º prêmio
Nhacurutú
Nhacurutu (Bubo virginianus) e outras vozes pantaneiras
Priscilla Diniz
2º prêmio
Iraúna-de-bico-branco
Iraúna-de-bico-branco (Cacicus solitarius)
Paula Vanessa P.A. Gonçalves
3º prêmio
Corujinha-do-mato
Minha Amiga Corujinha
Humberto de Jesus Caldas Pereira
Avistar
Cri-crió
LIpaugus vociferans
HOTELS
Nhacurutu e outras vozes pantaneiras
Autorx: Maristela Benites
Espécie: Jacurutu (Bubo virginianus)
Narrativa:
A paisagem sonora da planície pantaneira encanta pela riqueza de sons, pela expressividade de sua biodiversidade e pela harmonia entre graves e agudos, como uma orquestra em perfeita sintonia. Às 04h30min da manhã, o casal de nhacurutus imposta voz profunda e grave, a somar-se ao coro de sapos, rãs e pererecas, além dos mosquitos e vôo de morcego, criando uma melodia tão equilibrada quanto fascinante.
Mas as águas do Pantanal não cantam apenas beleza, elas ecoam um simbolismo profundo e urgente. De forma atípica, entre os dias 14 e 20 de abril deste ano, chuvas intensas caíram sobre a planície, especialmente na região de Miranda, enchendo baías, corixos, brejos, rios e vazantes. Abril marca o fim da estação chuvosa, e maio principia o período de seca. Este ano, porém, a cheia era improvável: as precipitações que costumam abastecer as cabeceiras de rios no planalto - geralmente concentradas entre dezembro e fevereiro - não ocorreram como o esperado. Quando esse período passa sem chuvas abundantes, a planície dificilmente se enche.
E as cheias, pequenas ou grandes, são o pulsar do Pantanal. Elas movimentam a roda da vida e sustentam gentes, plantas e bichos com água, alimento e esperança. No entanto, entre todos os biomas brasileiros, o Pantanal é o que mais perdeu superfície hídrica em relação à sua média histórica: um declínio alarmante de 61%. Dados do MapBiomas revelam que, em 2024, o bioma permaneceu abaixo da média em todos os meses do ano. E tem sido assim nos últimos cinco anos, um Pantanal que arde em chamas.
Por isso, cantar para a chuva, com a chuva e pela chuva é um ato de esperança, de sede por água e fome de vida. Essa paisagem sonora é um encontro de timbres: graves e agudos, gemidos e trinados, vozes profundas e finas que se entrelaçam numa amplitude vocal única, onde cada ser contribui para a sinfonia da existência e coexistência no Mar de Xaraés.
Essa música da natureza não é apenas um espetáculo, é um manifesto. Uma narrativa de luta e um canto de esperança por um Pantanal conservado, para que a sociobiodiversidade permaneça vibrante, encantadora e eterna.
Autorx: Priscilla Diniz
Espécie: Iraúna-de-bico-branco (Cacicus solitarius)
Narrativa:
Os fins de tarde nas várzeas de Iranduba sempre trouxeram surpresas. Às vezes, anambés-pombo em um delicado balé por entre suculentas embaúbas. Às vezes, um discreto rapazinho-de-boné-vermelho provando-se um exímio caçador de insetos, bem ao alcance dos olhos. Ou então, uma família de pica-pau-de-topete-vermelho, onde os mais velhos guiavam seus jovens pelos caminhos nos troncos de coloridas mungubeiras.
Os sentidos não encontravam tédio naquele lugar.
Por vezes, as embarcações cortavam o Solimões com música alta e risos escandalosos de seus tripulantes. E outras vezes, cortavam o céu os bandos de japins e papagaios-da-várzea. Havia os dias de chuva, em que trovões se misturavam à cadência hipnótica do canto do casal de joão-teneném-de-becuá.
E houve esta tarde — silenciosa, quente e chuvosa.
Caminhava em busca da surpresa daquele dia quando meus ouvidos detectaram um som. Antes que eu encontrasse o emissor, pensei que era um som que poderia descrever bem a diversão. Quem quer que fosse, parecia feliz.
Fui me aproximando com cautela — o calor abafado fazia cada passo pesar um pouco mais, e eu não queria assustar a alegria por trás daquele som curioso.
Assim que o identifiquei, liguei o gravador: era uma festa solitária, como o solitarius que batiza a espécie — Cacicus solitarius. Lá estava o fanfarrão, se misturando à vegetação emaranhada dos estratos mais baixos da várzea. Procurando insetos? Brincando? Existindo? Tudo ao mesmo tempo?
Consegui capturar sua vocalização alegre — e sei que meu sorriso sentiu-se convidado a se abrir diante da cena, diante daquele som que parecia rir sozinho do mundo.
Autorx: Paula Vanessa Pires de Azevedo Gonçalves
Espécie: Corujinha-do-mato (Megascops choliba)
Narrativa:
No ano passado uma corujinha passou a se abrigar em um flamboyant gigante que fica na calçada da minha casa com seus galhos se espalhando quintal adentro. Vou contar os acontecimentos sobre a gravação do canto dela.
Moro longe do centro, em um bairro urbanizado, mas com poucos vizinhos, pois a cidade é turística, é um lugar silencioso. Fico sozinha em casa e tenho como companhia meus gatos e cachorras. Então ganhei uma nova amiguinha, a corujinha-do-mato, e sua vocalização deixou minhas noites mais bonitas.
Me divertia ao ouvir e responder seu canto, por isso resolvi contar sobre minha nova colega no grupo de Whatsapp da família. Escrevi sobre a corujinha do flamboyant, e o ar de mistério que ela traz rompendo o silêncio da noite com sua voz. Mas apenas escrever não evidenciava esse encanto da natureza, nem a importância do nosso encontro. Eles precisavam ouvi-lá assim como eu.
Sempre gostei muito de bichos e de contar histórias, adoro registrar e falar sobre todos os animais que aparecem no meu dia a dia. Por isso, não queria que este bichinho fosse só mais um e resolvi gravar direto no grupo da família.
Na primeira tentativa, assim que saí para o quintal as cachorras acharam que era brincadeira, correram junto e latiam interferindo no áudio, fiz outras tentativas que foram igualmente sem sucesso. Então, minha nova estratégia foi gravar de dentro de casa, na sala, por uma porta de madeira vazada que dá para o quintal. Ainda assim não tive êxito de primeira, às vezes a coruja não estava perto o suficiente, em outras as duas cachorras, lá de fora percebiam a minha aproximação, vinham pra perto fazendo barulho, além de outros ruídos que também causavam interferências. Mas, nem pensei em desistir, queria registrar esse momento e apresentar a corujinha para a família.
Um dia fui pé ante pé até a sala, coloquei o celular no vão da porta e fiquei imóvel, fiz várias gravações por precaução. Depois que me afastei, pude ouvir os áudios e soube que tinha conseguido. Enfim, estava registrado seu cantar que preenche minhas noites de mistério.
Com a chegada do verão e dos turistas não escutei mais a corujinha, até que, na semana passada, ela cantou novamente no flamboyant gigante. Então, minhas filhas conseguiram identificar a espécie com um aplicativo de celular, uma corujinha-do-mato, e, depois, me encorajaram a participar do concurso do Avistar. Assim, pude contar para mais pessoas que adoram as aves a história da minha amiga noturna, que canta em diversos momentos da noite, e me faz sentir que ninguém está sozinho nesse mundo.
Autorx: Humberto de Jesus Caldas Pereira
Espécie: Cricrió (Lipaugus vociferans)
Narrativa:
VOZ TOCANTE
No estado do Pará
Município Cametá
Beira do Rio Tocantins
De férias eu por lá
No segundo dia do ano
O Sol raiou, amanheceu
Fui sozinho contemplar
O que é seu? O que é meu?
Uma trilha desconhecida
Não sabia o que encontrar
O coração me dizia
"Coisa nova vai achar"
Trecho de mata de várzea
Vi um sapo e duas rãs
Socó-boi e Socozinho
E o Lipaugus vociferans
Cheguei perto e gravei
Mas não pude enxergar
Eles camuflam muito bem
Difícil é fotografar
Mas a foto não é tudo
É a voz que é tocante
Natureza de filme gringo
Existe sem o "Vociferante"?
Ele é todo poderoso
Voz tocante da Paisagem
Merece algo neste concurso?
Seria bom uma homenagem!